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domingo, 8 de julho de 2012

TeAndara: Teatro Invisível

Vicente Franz Cecim






 

          BREVE INICIAÇÃO A TEANDARA



         O Teatro Invisível de Andara é, diferentemente do teatro da Presença tradicional, o teatro da Ausência. Dispensa, progressivamente, até a máxima ausência: atores, cenários, elementos de cena, ações encenadas num palco, e até o próprio palco, podendo ser apresentado em qualquer espaço físico. Alguém sentado em uma cadeira, ou no chão, ou em pé, diante de uma parede nua, pode assistir a uma TeAndara peça. A opção pelos graus desse progressivo Despojamento dependerá unicamente do encenador das peças TeAndara. A opção preferida pelo autor das peças TeAndara é a mais Despojada de tudo: quase ironicamente, as luzes da Platéia se apagam, se abre a cortina para um Palco Vazio aleatoriamente iluminado, por luz ou luzes intensas ou brancas ou em cores ou de uma só cor conforme a atmosfera da TeAndara peça que será apresentada: enquanto a Luz do Palco vai sendo lentamente apagada, os espectadores são convidados por Voz anônima cuja origem é invisível a irem fechando os olhos para começarem a assistir à peça TeAndara, a ser apresentada pelo Teatro Invisível de Andara. Fechar os olhos – por que? Porque as TeAndara peças se encenam no Interior de cada espectador. É o Teatro do Imaginário Humano,
onde cada espectador, diferentemente da postura passiva ou da situação de mera catarse que lhe determina o teatro da Presença tradicional, é chamado a uma participação, a ser ativo, a ser o Criador, em Si, da TeAndara peça – fundindo os atos de assistir e de representar em um Ato Único: ele se torna, ao mesmo tempo, espectador + ator + personagens + leitor & dramaturgo + cenógrafo+ encenador das TeAndara peças.  As dificuldades emergentes e os Despojamentos possíveis com que irá se confrontar o Encenador das TeAndara peças variarão de graus e intensidades, a cada uma delas. Vejamos quais podem ser essas Variantes de encenação:

I: Algumas se consentirão ser encenadas utilizando o mais radicalmente Mínimo recurso: apenas uma Voz narrando para a encenação individual no Teatro do Imaginário Humano – se encenando no espectador de olhos fechados.
 
II: Outras permitirão que alguns elementos de cena sejam mostrados na abertura da cortina para o palco iluminado, antes que as luzes comecem a
se apagar. Da mesma maneira, nesses casos, é possível mostrar, também, um ou mais personagens, antes das luzes se apagarem e os dissolverem no escuro. Mas serão aparições muito Fugazes - tanto os elementos de cena quanto os personagens, muito fugazes: como que clareados por relâmpagos. Serão apenas breves provocações sugestivas ao Imaginário do espectador, instilações mnemônicas para sua encenação pessoal da TeAndara peça.

III: Ou, quem sabe, se poderia esboçar alguma ação essencial, preliminar, cerne do assunto da peça, muito curtamente - com a mesma função iniciatória relampejada, à TeAndara peça.

IV: Uma alternativa híbrida seria: dando à Voz Invisível que narra a TeAndara peça o papel principal, condutor, aqui e ali, esparsamente, encenar e mostrar em cena alguns dos personagens e ações que irão sendo sobretudo descritos pela Voz. Surgindo brevemente ao longo da peça e logo se dissolvendo e sumindo da cena. Como Visões num sonho. Ou fragmentos de sonhos. Importante: - Isso deveria ser feito de forma absolutamente Lúdica – não da antiga forma dramática. Certamente seria instigante e poderia se tornar muito belo, esse surgir e sumir das coisas em cena. Seria uma representação do Efêmero. Mas, certamente, também estaria sendo uma muito generosa concessão do Teatro de Ausência TeAndara ao antigo teatro de presença. E qual seria a posição do espectador? Nesses casos híbridos o espectador estará sendo solicitado a ter apenas uma semiparticipação ativa na encenação da TeAndara peça, completando, pela intervenção do seu Imaginário, os fragmentos de encenação lançados do palco a ele - a partir das sugestões que lhe irá dando a Voz narradora.



EIS A SEGUIR DUAS TEANDARA PEÇAS:







I

ATO ÚNICO: 7 HOMENS TRISTES
VICENTE FRANZ CECIM


ação & dramatis personae/
palavras & sons: como se seguem


Cena I

         sete homens vestidos de negro inteiramente negro
como a noite mais negra de todo o universo
         atravessam uma paisagem de deserto com areias a perder de vista sob
uma luz de sol a pino que não se vê
         a paisagem toda cercada pelas paredes muito altas do grande aposento de uma casa

         o último homem Negro da fila implora a um grande gato que anda a sua frente indiferente aos seus apelos e inteiramente branco tão branco quanto a mais excessiva luz que possa se ver no universo
         que lhe permita falar ao menos uma vez com deus

         um raio cai do céu e o clarão cega todos por um instante e eles caem no chão
         como mortos ou desfalecidos não se sabe

         o gato foge com um longo grito alucinado

         AS TREVAS DESCEM SOBRE A PAISAGEM


Cena II

         AS LUZES VÃO SE ACENDENDO NOVAMENTE E SE VÊ

         sentado sobre uma nuvem imensa artificialmente feita de flocos de algodão uma manifestação da Imagem Ocidental de Deus comenta esses acontecimentos que acabou de ver com um Dragão Vermelho de peça de teatro Kabuki que fica se bamboleando ao seu lado sobre um tablado em forma de livro
         um livro também imenso azul com letras douradas
         em sua lombada se pode ler TRATADO DAS COMPREENSÕES VELADAS
        
         O DEUS: jurei jamais dizer a palavra Nada depois de ter criado a vida
         mas terei que dizer nada agora pela segunda vez isto é terceira nada se compara ao homem em espanto e sabor de doce-azedo em todo o universo
         O DRAGÃO: verdade seja dita que São Jorge também esperava deles muito mais do que lhe dessem a Lua gelada para morar eternamente
         e quanto a mim não lhes perdoarei nunca ter que suportar
         pela eternidade
         a fria lança cravada em meus flancos enquanto eles se divertem
         em seus jogos e danças amorosos se espetando outras pontas agudas feitas da sua Carne
         furiosamente
         e multiplicando os seus filhos para que por mais eternidades ainda haja gente lá na Terra para permanecer contemplando a Lua e a cena mística cruel que conceberam de São Jorge Espetando o Dragão
         PAUSA
         tudo indica que isso durará até o final dos tempos
         O DEUS: não não não permitirei que essa frase seja pronunciada
         em minha presença final dos tempos
         o homem já que é obra minha mesmo que a mais Imperfeita e Inacabada das obras que criei deverá perdurar para sempre e sempre et sempre ainda que a tudo o mais inflija a dor e a destruição
         a todas as coisas vivas ou mortas ou doces ou amargas ou líquidas ou feias ou belas ou infantilizadas ou amedrontadas ou arenosas ou matutinas ou crispadas ou ventrudas ou ausentes ou azuladas ou febris ou friorentas de quantas eu criei e depois continuaram se multiplicando já sem mim sem precisar de mim para mais nada quarta vez
         não nÃo NÃO

         a esse último grito de deus que soa em toda a abóbada celeste com um estrondo insuportável

         CAEM AS TREVAS SOBRE TUDO NOVAMENTE


Cena III

         voltando pé ante pé à PAISAGEM DESÉRTICA ENTRE AS PAREDES ALTAS DA CASA que vai clareando lentamente lentamente
         os sete homens de negro estão voltando SOB A LUZ DE SOL A PINO que não se vê

         entra o primeiro e observa o dorso da sua mão esquerda detalhadamente com uma lupa
         entra o segundo e segura o pé direito e o leva ao nariz inalando o seu odor profundamente
         intrigado
         entra o terceiro e no meio da cena pára e se põe a arrancar seus cabelos se desprendem aos chumaços e ele vai plantando os chumaços no chão
         curvado
         como o agricultor do Ângelus de Millet
         a luz nesse momento se torna crepuscular
         ouve-se enquanto a luz decresce o Ângelus das 6 Horas da Tarde crescendo de intensidade
         mas algo quebra o disco que range distorce os sons e finalmente pára
         a luz volta ao normal que sempre é luz de sol a pino violenta cegante

         entra o quarto que enfia nos lábios grandes Pregos Negros
         entra o quinto que traz um rouxinol amarrado com correntes para que não fuja a fera perigosa
         entra o sexto que traz também acorrentados o seu Pai e a sua Mãe os dois já muito velhos
         arrastados atrás de si

         todos agora estão na paisagem desértica entre as paredes altas sob a luz intensa cada um ocupado conforme entrou
        
         passa-se um tempo longo com eles ocupados nessas atividades

        
         então entra o sétimo homem com o grande gato         
implorando a ele que lhe permita falar com deus ao menos uma vez
         exatamente como no início de tudo
         o gato espia o céu e como um cão uivando para a lua lança um longo Miauuuuuuuu em direção à abóbada celeste
        
         todos param para observar o Gato miando para a abóbada vazia
         longa & grande imobilidade em cena
         longa & grande imobilidade em cena

         aí de um buraco imenso que se abre subitamente no chão emerge o deus
         domina toda a cena com sua vasta estatura
         avança para o gato que mia para o céu e o despedaça jogando depois os destroços do corpo retorcido no areal e torna a sumir buraco adentro no chão uma descida
furiosamente crispada de faíscas e emanações de gases rubros que lembra a descida que o Inconsciente imagina ser assim às profundas do Inferno
        
         todos voltam às suas atividades anteriores
         o primeiro homem de negro observa o dorso da sua mão esquerda detalhadamente
         com uma lupa
         o segundo segura o pé direito e o leva ao nariz inalando o seu odor profundamente
         intrigado
         o terceiro parado no meio da cena arranca os seus cabelos se desprendem aos chumaços e ele planta os chumaços no chão curvado
         como o agricultor do Ângelus de Millet
         a luz novamente se torna crepuscular decrescendo
         enquanto novamente se ouve o Ângelus do Crepúsculo crescendo de intensidade
         mas algo quebra o disco que range distorce os sons e finalmente pára
         a luz volta ao normal e sempre é luz de sol a pino violenta cegante sol que não se vê no alto da paisagem só sua luz
         o quarto homem de negro enfia nos lábios grandes Pregos Negros
         o quinto que trouxe o rouxinol amarrado com correntes parte as correntes e solta a ave que foge velozmente se debatendo contra as paredes até encontrar uma saída sangrando muito
         o sexto ao contrário vai buscar no canto da casa amontoada junto a uma parede mais corrente e reforça a prisão dos já acorrentados seus Pai & Mãe

         o sétimo homem sozinho num canto da parede
         olha para a abóbada celeste
         olha longamente
         enquanto os outros seguem outra vez ocupados em suas atividades e ignorando totalmente uns aos outros e a ele o sétimo homem

         o sétimo homem se põe de quatro Animalmente e esticando o pescoço até um ponto de tensão insuportável para o céu emite um longo infinitamente triste e desesperado uivo

         as luzes e os sons da cena vão decaindo lentamente até as Trevas totais
         e o Total Silêncio



TEANDARA: TEATRO INVISÍVEL
VICENTE FRANZ CECIM
CONCEPÇÃO EM 1997

ATO ÚNICO: 7 HOMENS TRISTES
Versão transcriada em 2004












II

APÓS A SEDE DOS DESERTOS

VICENTE FRANZ CECIM


ação & dramatis personae/
palavras & sons: como se seguem


um homem nu envolto num lençol rubro de sangue flutua no ar, horizontal ao horizonte, peito para baixo às vezes vira de peito para cima, para o céu, flutuando a um corpo humano de distância da areia por baixo, a infinitos corpos de distância do céu por cima quando volta para ele sua face no céu, vê nuvens de sal, que às vezes passam e vê outras coisas: aves, anjos, grandes manchas negras de culpa e às vezes não vê nada, se nada está passando, tem apenas o grande céu vazio por cima nas areias, no também grande deserto por baixo dele, também vê coisas coisas que ali estão passando: insetos, só os grãos de areia levados pelo vento, pedaços de papéis onde lê, aos fragmentos, em voz alta, coisas escritas: fragmentos dos Upanishads talvez, cenas de Don Quixote de la Mancha talvez, de Homero: Ulisses e as sereias talvez às vezes o homem flutuante julga ouvir também o canto das sereias às vezes espera ver os gigantes moínhos surgirem do horizonte vindo em sua direção pede a Dom Quixote emprestada a sua lança: Se eu tivesse lanças
às vezes, fortes rajadas de vento sopram em seu rosto, empurrando todo o seu corpo para trás: é preciso resistir, sufocando de tanto ar, nadar para frente batendo os braços com gestos bem desesperados, resistir para não ser levado pelos Ares e para onde? e para onde, nesse céu, para que parte desse céu que geralmente está vazio? e silencioso? tão silencioso que é inútil esperar por qualquer resposta a essa pergunta, mesmo quando o homem flutuante faz a pergunta ao vento: Lavado pelas águas desse vento, para onde? serei então levado? e para onde?
sempre que vem uma das rajadas de ar, é preciso calar: pois ele fica sem ar, por excesso de ar, e tem que engolir as palavras que pretende dizer e as noites vêm sobre ele, as estrelas vão surgindo no céu, a lua, amarela, sua luz amarela uma grande estrela às vezes surge sobre o deserto como a Estrela da Anunciação do Nascimento da Criança na Manjedoura e pousa sobre o homem e o envolve todo em sua luz, uma intensa luz azul sobre a areia branca azulada a perder de vista e se acende ao fundo como a projeção de um filme o Sagrado Coração Sangrando, aberto, o seu Martírio na hora do crepúsculo: ouve a voz do Ângelus e nascem e renascem os dias, muitas alvoradas também muitos crepúsculos, sempre passando pelo homem flutuante e sempre e sempre, rajadas fortes de vento: e sempre que uma rajada de ar vem ele tem que engolir as palavras que pretende dizer, enquanto ouve uma voz ecoante que se faz ouvir vinda de todas as partes da Vida – da areia por baixo dele, do céu por cima dele, inatingível - uma Voz que diz: - No Início era o Verbo sufocante
ante 
                     ante
                
             ante voz se distanciando depois > Silêncio 





então, voltam palavras & sons:

o Homem: olhando esses grãos de areia, náufrago no ar, às vezes sendo levado pelo vento, mas não agora, agora não há vento soprando, nem uma brisazinha vem
  náufrago no ar, como se fosse um lençol arrancado do varal numa tarde de sol, ou arrancado de uma cama, despertando de seus alvos sonhos muito brancos, levado pelos ares, deixando nus os sonhos de toda uma noite gelada
  náufrago
  no ar
  vendo passar um inseto, que lá de baixo Me vê aqui em cima, boiando na calmaria, agora que não há mas vento soprando, nem uma brisazinha

  o náufrago, no ar, não negro: Vermelho como sangue, para matar a sede deste deserto em que flutua

  etc
         etc    
                   etc






TEANDARA: TEATRO INVISÍVEL
VICENTE FRANZ CECIM
CONCEPÇÃO EM 1997

APÓS A SEDE DOS DESERTOS
2004



domingo, 1 de julho de 2012

X Asa de murmúrios

  VIAGEM A ANDARA oO LIVRO INVISÍVEL
 II foi no Tempo





foi
no Tempo,

um Lugar, onde estive


centro, para os Repousos humanos


Madeira
que os sóis conduziam às Cinzas
da Aurora ao Crepúsculo
madeira sempre sonhando com náufragos distantes pedindo um destino
de taboa de salvação,
quando chovia

gasta pela água dos céus
pelos Corpos que por ela
passavam

e Sumiam

como os homens nascem, o sol nasce
todo dia o sol nasce
e os Frutos na Árvore da Vida

e somem


Depois,
as Chuvas indo nos banhar
na Profundidade da Terra esperemos nos sonhando,
na Sede
onde depositados quantas Relíquias sendo esquecidas a cada dia iremos
afundando      Para um centro, para um centro

para o centro

do Centro


na Esfera
entre as estrelas,

como se Ser Circunferência fosse para Sempre




Foi
no Tempo

Quando uma vez estive no Centro


Havia a Sombra de Tudo e as sombras das árvores e das asas,
umas pousadas sobre nós outras voando baixo aqui
na Terra como no Céu,
                                      Lá
Fosse uma Tarde
Quantas Cicatrizes jogadas ali pelo chão
E te dissessem que Anjos haviam vindo curar Aquelas feridas


As Vozes,
te dizendo

aguarda a Árvore na Sombra da Semente
há Lentidões nos Rostos vazios das Miragens, Elas partiram
não há nada a dizer sem um Soluço
não retira a Tua mão da minha


seria o Inesperado
se visse Sem Nome




fosse uma Tarde
Mas tu não sentias a Melancolia dos Crepúsculos e nem ouvias o Rumor
de asas
então, fosse Manhã         ah Aquela manhã

nela a Noite,

resistindo



E vias as Marcas dos passos
Chegando e partindo da
Madeira

gasta pelos Corpos por ela
passando nas

coisas de sentar, ali

partindo e chegando, os homens, das coisas de sentar

coisas de sentar em Círculos
fosse no Centro do Mundo,
                                                        mas Longe



Olhando esses Passos,
aos teus pés,
ouvias Ondas gastando outro corpo        
                                                        a Nau

que partia ou chegava

a Nau

navegando na Areia se misturando
às Cinzas da Madeira, onde os corpos
passando, e sumindo, Fossem homens




Havia o Deserto sem margens

Havia aqueles lugares de sentar em Círculo de madeira onde às vezes deitar

Onde as Noites eram mais frias
e uns Ossos
e uns Desabrigados portodaparte,
                                                        ali

adormecidos

Deles fossem os passos




foi

no Tempo #



no Outro tempo não vias os Passos,

partindo e chegando

através da Madeira: Passagem
de Cinzas
                   e para Onde?


relógios de areia foram semeados nos Bosques
relógios de cinzas foi um tempo
de ventos apagando passos num deserto

aqueles passos Tu não viste



Não era o Tempo dos Lagos


que virá

te voltando para a frente de Timesmo
Água de limo no fundo dos Olhos

para que vejas, Vendo                                      a Nau

se afastando


no Centro do Silêncio



sábado, 30 de junho de 2012

IX Corpo nu da Demanda profunda VICENTE FRANZ CECIM










NO BEIJO HUMANO
Terra, Magritte







Tomba,

quando virá à Tona coberto de Cinzas

quando dará às Fontes suas mãos de Encantos em ruínas até
à Seca folha lágrima Raiz da Desfolhada não nascida

quando dirá ao outroO
nascendo do seu Lado Esquerdo com a ferrugem
das Catedrais partidas
- Busca

O ourO Escuro


para onde, para onde


Irá
indo,
indo

com sua imortalidade de lençóis de Alvura: O naufragado em terra,
caminhando sobre águas brancas que não vê


de despedidas de reencontros de Trevas murmurantes
Pedra de Queda como um fruto: o Fruto O

que alcança a outra margem: Oo

Fervor de Limo
Levanta vôo para baixo


Quando obterá a recusa da Envolvente?

e o Não lhe será um Dom
de Indiferença

que poupará, por Desprezo
que poupará, pelo silêncio
















O BEIJO DAS NEBULOSAS
Cosmos,  Hubble

segunda-feira, 18 de junho de 2012

Bem-vindo ao estranho mundo




VIAGEM A ANDARA oO LIVRO INVISÍVEL
De Ó Serdespanto




















Em algum lugar do estranho mundo
mãos se tocam em silêncio branco
Ah o encanto da carne

quando esquecida é a existência do deus
que causa a dor

Uma ave vai pousando em seu ninho,
traz nos olhos os espantos do dia que se acaba, se acaba

Mas a tarde nos serena, com a promessa
de que logo vai anoitecer
para novamente nos tornarmos sombras, nos tornarmos sombras,

nos tornarmos sombras

Devolvidos aos ninhos escuros, escuros, escuros


Ah como nos assusta caminhar sob um sol 
A este lado da esfera
ainda não veio o tempo do repouso  A terra geme,
a fatigada, fatigada

Os homens nos caminhos do crepúsculo da raça

perderam seus olhos
nos cílios pesados de bronzes antigos  As estátuas com nódoas de vergonhas,
a vergonha, a vergonha 

Nunca mais tu ouviste
o sino que chamava os gestos brandos do fundo
do templo

Ah a sina
do efêmero encarnada em tudo que se move
à nossa volta
Mas tu ouves num inseto de outono o Inseto
do outono
As folhas que se fecham sem desprezo

Num ramo que se parte e cai sozinho,
nenhuma força negativa pousou neste inverno

No estranho mundo, alguém está deixando
o pequeno porto
em seu leito de morte,

e isso nos faz mais lentos do que o cedro transformado em leito macio

porque de madrugada alguém, que será outro,
acaba de nascer na casa verde ao lado

Ah o ir e vir dos viajantes pelas estrelas, as estrelas,
as estrelas
Como tem poder um gesto
branco branco
quando vêm do fundo na noite os silêncios
em que nasce a flor a rubra da ternura
  
À noite a noite a noite

banhará as frontes que sonham serenas o sereno
Um cão se encosta ao dono
e ao seu odor humano

Ah como é lento este aprender a semelhança

entre a pata do animal e o gesto humano

Misteriosa, uma estrela agora desce sobre o bosque
dos destinos
A filha dos pântanos se agasalha em folhagens negras
O sol tem um ritmo de sangue,
anunciando um novo despertar do mundo

Ah como renasce este outro lado da terra, a dourada, para a luz
Um emblema de paixão te é dado a cada dia
E o vinho está servido nos sentidos

para ser bebido por aqueles que tiveram as suas mãos feridas, feridas,
as feridas


Claro e escuro é o mundo
Claro e escuro é o mundo


Ah o espanto daquele que desperta após um breve sono  O anjo, em ossos
e sangue
Se adormeceu no fim da tarde
e abre os olhos na penumbra
que não sabe
se anuncia um anoitecer de pedra
ou ainda a areia as auroras da vida

Por algum tempo, permanece mudo
E não pode se dizer o que virá depois, se luz, se treva

         
Ah a garganta quando quer cantar uma canção de pura luz

Ah o irmão perdido  Ah a voz que prefere calar
diante do crime do irmão 


Em algum lugar do estranho mundo
mãos se tocam em silêncio branco,
olhos se olham em virtude azulada,
peles se roçam na intimidade dos amigos

Ah os ninhos que se constrói com o afagado
e o murmurado

Quem são aqueles dois que agora cruzam a ponte

entre suspiros e brumas,

ignorando o cão de ferro que late em seus calcanhares

Levando um peixe de ouro, o pescador de sonhos
Ei-lo que vai voltando para o recanto do estranho mundo onde ergueu sua casa
de palha e centelha convivendo em paz

Ah a ave distendendo as asas
no amanhecer do ninho, o ninho
para reiniciar a aventura da leveza

Como é leve esta pedra no caminho

Como é longo o culto à árvore
em que se enterram as raízes da família
e o choro da criança pela primeira vez

Não tires a tua mão da claridade

da minha mão cansada que repousa em ti,
para ocultar na sombra

Ah

não esperes o receio
para te abrigar em meu peito, diz a voz branda
e longe uiva a fera do adeus

Quem são aqueles que atravessam a ponte
sem temer o cão de ferro, a vida
E por que ainda está ausente o peixe

As planícies de escamas, ao longe, ao longe ao longe Mais uma estrela
caiu dos teus olhos

Ah os que caminham juntos sobre as águas
e a paciência do homem com a madeira
para fazer a casa e a cama

onde o recém-nascido acaba de chorar pela primeira vez

enquanto a vida também constrói para ele
uma ponte
e um latir de ferro em seu calcanhar
apontado para o céu,
enquanto o sangue verde lhe desce à cabeça
enquanto o olhar da mãe de lábios lívidos

Ah o nome que daremos a tudo isso
que nos envolve,

e que chamamos vida,

quando voltarem os tempos perdidos
ao regressarmos aos ninhos de verão,
dois a dois
atravessando a ponte,
pisando as marcas dos passos dados pelos anos puros


Aquela que tece a lã generosa
  
porque crê no balido do amigo,

ah
como a chamaremos depois que cessar nosso primeiro choro
e a Casa ao lado for a nossa casa?


Ah o encanto da carne

quando é esquecida a existência do deus
que causa a dor

Ah o encanto da dor
quando esquecida é a existência do deus

que causa a carne



Mãos se tocam em silêncio branco

em algum lugar do branco e estranho mundo






quinta-feira, 31 de maio de 2012

VII Cinzas do Caminho que se encontra



porque o dia que passa agora é um Sol negro nos Passos humanos, sobre nós,



eu

te acolho em minha Sombra

de Ternura para o Incêndio das Fontes que virão



E se dizes, dos meus passos: São meus passos

eu digo dos teus passos: São Teus passos





E assim,

indo,



aVe



que o Vento nos ventos: Destinos de areia



já não sabe se conduz ao Crepúsculo

ou se a Aurora já é a Penumbra que cintila em nossos Olhos,



porque outra vez Somos o que fomos





Eis:



a Asa

Invisível



murmurante no Horizonte





Pois agora Teumeu é o Corpo Entre Véus



oO Pas



so

que vindo,



não passará



terça-feira, 29 de maio de 2012

VI Oniá um Lugar cintilante

VIAGEM A ANDARA oO LIVRO INVISÍVEL
I fragmento de Oniá um Lugar cintilante, livro visível de Andara em manifestação





Fosse uma vez em Andara

Um homem olhando um horizonte vazio de repente viu outro horizonte vazio em si



O que faz um homem quando cai assim sem ter mais o Amparo de estrelas e carne nO Vazio sem fim fora e dentro de si? Debaixo dele desapareceu a Terra, sobre ele já não havia mais o Céu

e sua cabeça tombou para o peito escuro esse peito sem fundo

Ficou ali nO Escuro nada havia a fazer a não ser ficar ali



A menos que



Se nada acontecesse nada aconteceria

Mas aconteceu



Um vento vindo não se sabe de onde passou por ele agitou seus cabelos e se foi sumindo na Floresta que as suas costas ocultavam

Esse vento

veio como o Vento da Voz que tendo o Dom de nos adormecendo criar realidades fosse essa vez em Andara vai contar esta história,

mas sendo o Vento da Vida em vez de o adormecer, o despertou de seu vazio vazio O Vazio em que tombara

e



O que acontecerá agora?



E

o despertando ou lançado dentro de um sonho em que voltavam sob ele a Terra e sobre ele o Céu,

ele imergindo nisso, ou emergindo do Vazio

horizonte vazio homem vazio

e tudo isso ficando para trás,



agora se levanta para ir atrás do vento



Melhor dizer, do: Vento

Pois pela Fenda da Palavra entramos e nesta Dobra assim aberta para a Neblina de sermos agora estamos em Andara e Aqui que é um Lá não se sabe onde e quando, Onde e Quando,

só se sabe que em Andara todas as coisas são coisas passando não duram não duram, sendo como na Vida,

mas se numa delas uma Atenção humana se demora,

essa coisa coisa logo se transforma em Coisa

e é assim que em Andara surgem coisasCoisa,



essas coisas não sendo mais as coisas ventos águas aves árvores pedras horizontes estrelas olhos noites dias

e se tornando Entes



Ainda que entes neblinas

Na Penumbra Andara



Pois esse é o dom: o Dom, dessa Penumbra, aqui: pela Neblina dar vida que dure ao que fora de Andara sempre passa e some, em outras neblinas que não duram

Na Vida



Então,

vejam, olhando para trás,

quantas coisas assim mal começamos já quiseram ir mais além da duração que passa

e, pela Neblina,

se tornaram névoas que ganhando um eu: Eu, duram



Em Andara, sendo assim. Entendam. Sempre que se diz de um vento: o Vento

se nele eu me detenho mais que por um Alento distraído: nasce um ser

que já não é mais um fui serei,



mas um Sendo



E sendo, fosse Aquele Vento o que veio,

passando nos cabelos do homem



que agora, se erguendo, vai seguir o vento floresta adentro, Floresta adentro,

pois também uma floresta, em Andara



Ah,

Andara



Quantas névoas para resistir a carne que não dura





Mas mal se levantou aquele homem para dar o seu primeiro passo nesta história, e já tombando

pois tropeçasse numa pedra que estava em seu caminho,

entre ele e a Floresta, aquela pedra



e dela deve se dizer, também: pedraPedra



Melhor será deixar que as pedras da vida também penetrem em Andara que as árvores da vida também cresçam em andara que as aves da vida e as estrelas e insetos também rastejem e voem em Andara

melhor será deixar que Andara também seja apenas andara



pois como se mover no mundo mesmo sendo só este Esse mundo de palavras: Andara,

através de tantos entesEnte

tantas presençasPresença

e tantos seresSeres





Ser de Escritura



Entendam:

isto, sendo um Livro, é só um Serdescritura, onde palavras que se alucinam já não sabem que Sonhando vivem

e nenhuma Lei impede que de um Ente se diga ente

que de um ente se diga Ente



E que de Andara se diga ora andara ora Andara



Porque agora esta escritura: Escritura,

assim tão recente, mal se iniciando a história já se desfaz toda em ruínas, e é antiga como o Caos: o caos

de onde tudo,

vida e sonhos,

se origina?





Ah

O Que escreveu essa primeira Origem? A do Caos





Recomecemos,

indo, por entre o que passe e dure palavras coisas e vida em vida e neblina em neblina



Recomeçando: Fosse uma vez em andara

Um Homem olhando um Horizonte vazio de repente viu outro horizonte vazio em si



O que faz um homem quando cai assim sem ter mais o amparo de estrelas e carne nO Vazio sem Fim Fora e dentro de si?

Debaixo dele desaparecendo a terra sobre ele sumido céu

e sua cabeça Tombou para o peito escuro sem fundo

ficou ali nO escuro nada havia a fazer a não ser Ficar Ali



e depois

mal se levantou aquele homem para dar o seu primeiro passo, renascido, e já Tombando

tropeçando numa pedra que estava em seu Caminho,

aquela pedra entre ele e a floresta,



pedraPedra



Melhor seria se as pedras da vida em Andara



Ah,



o certo é que o homem tropeçou na pedra, e um osso se partindo em seu pé esquerdo,

já começasse ele a sua busca do vento sumido na floresta como um  homem é

coisa que avança Cambaleante, buscando

e cambaleando



e a pedra ia rolando atrás dele



Por que aquela pedra agora o seguia enquanto ele seguia o vento, um partido Osso Órfão por companhia,

um pé de Dor o levando

um pé sem dor o retendo, atrás



pois cada passo que o esquerdo dava e doía

o faziam se apoiar no direito e não querer mais avançar mais nenhum passo em direção à dor que o esperava, sempre o esperando aquela dor um passo mais adiante



Da Dor se diga que pela dor que lhe causara a pedra a ele se unira



Pedra de Compaixão?



O que nunca se viu,

agora se visse. Aquela pedra assim se humanizando, seguindo um homem e seu osso órfão que partira



Oh, vejam quantas coisas podem nos acontecer só por sermos homens



Agora aqui se dando, pela compaixão daquela Pedra, o contrário daquilo que Aquele, antes de nós vindo e bem antigo, disse

- O homem é a medida de todas as coisas, das que são que são e das que não são que não são



 Quem?

 Que homem, agora no Tempo desnutrido. Qual pedra assim nutrida pela Dor?